A Sabedoria da Floresta e a Força de Ogum

A Sabedoria da Floresta e a Força de Ogum
Estou novamente em São José dos Campos e, como sempre que tenho oportunidade, aproveito para caminhar pela praça Vicentina Aranha, um lugar que considero especial pela sua beleza e pelas boas energias que transmite. Caminhar por ali me traz serenidade, sinto que o ar é mais leve e que as árvores antigas carregam memórias que falam em silêncio. Nessas caminhadas costumo tirar algumas fotos, registrando detalhes que às vezes passam despercebidos, e numa dessas manhãs fotografei um grande tronco caído, imponente mesmo deitado no chão. Continuei a caminhada e, enquanto seguia meu caminho, uma frase surgiu em minha mente e ficou ecoando: “Em toda floresta sempre há um tronco caído. Ogum rompe Mato.”
Ao chegar em casa senti que precisava anotar o que havia sentido, porque aquela imagem e aquela frase estavam cheias de significado. O tronco caído me fez refletir sobre a vida e sobre a natureza. A floresta é sempre lembrada como um espaço cheio de vida, verde e força, mas dentro dela sempre encontramos árvores caídas, galhos secos, sinais de fragilidade. Isso não diminui a sua beleza, pelo contrário, é parte da sua verdade. O tronco caído é símbolo da imperfeição natural, ele nos mostra que nada permanece erguido para sempre, que até o que um dia foi grande e forte pode tombar, e isso não é fracasso, mas parte do ciclo da vida. Mesmo caído, o tronco continua tendo valor: abriga insetos, alimenta fungos, enriquece o solo, serve de suporte para novas plantas. Assim, a morte se transforma em vida, a perda se converte em renovação. A floresta ensina que a fragilidade não é defeito, mas parte da harmonia.
Esse pensamento me levou a pensar também em nós, seres humanos. Em toda família, em toda comunidade, sempre existe alguém que passa por dificuldades, que sofre quedas, que não consegue manter-se de pé o tempo todo. Isso não significa fraqueza em sentido negativo, mas apenas a realidade da vida. Todos, em algum momento, somos troncos caídos. E mesmo assim, assim como na floresta, há valor nisso. As quedas nos ensinam compaixão, humildade e solidariedade. Quem nunca enfrentou um tropeço, uma perda, um momento de fragilidade? São justamente esses momentos que nos amadurecem e nos permitem renascer. A queda de hoje pode se tornar o adubo da vitória de amanhã.
Foi nesse fluxo de pensamentos que compreendi a presença da outra parte da frase: Ogum rompe Mato. Ogum é o Orixá da luta, da força e da coragem. É quem abre caminhos, quem não se intimida diante dos obstáculos, quem empunha a espada para vencer as dificuldades. Romper mato significa abrir passagem no meio do cerrado fechado, encontrar saída onde parece não haver caminho. E eu sei que essa energia não está distante de mim, porque Ogum Rompe Mato é uma das entidades que me acompanham de perto, sempre ao lado de Ogum Sete Ondas, que também caminha comigo. Ambos me lembram, em diferentes momentos da vida, que por maior que seja a dificuldade, sempre há uma força capaz de me ajudar a seguir em frente.
Percebo que o tronco caído e Ogum caminham juntos no ensinamento. O tronco mostra a naturalidade das mudanças, a inevitabilidade das quedas, e Ogum me ensina a não ficar preso a elas, mas seguir, abrir caminho, acreditar que mesmo em meio à mata fechada existe passagem. O tronco caído não é o fim da floresta, assim como nossas quedas não são o fim do nosso caminho. É só mais uma etapa, mais um aprendizado, mais uma parte da história.
Aquela árvore deitada no chão também me fez lembrar da importância de aceitar as mudanças. Muitas vezes resistimos, queremos manter tudo igual, mas a vida não é estática. Assim como as estações mudam, como árvores crescem e tombam, nós também estamos sempre em transformação. E essa transformação não deve ser vista como ameaça, mas como oportunidade. Quando algo termina, abre espaço para o novo. Quando um ciclo se encerra, outro começa. O tronco caído não é apenas sinal de fim, é também símbolo de recomeço.
Vivemos em uma sociedade que valoriza a perfeição, que quer ver apenas o que está de pé, bonito e vitorioso. Mas a floresta não é feita só disso, ela é feita da harmonia entre o que nasce e o que morre, entre o que cresce e o que cai. Assumir nossa imperfeição é libertador, porque nos dá a chance de sermos reais, de aceitar que errar faz parte, que cair é humano e que recomeçar é sempre possível. Não precisamos esconder nossos troncos caídos internos, eles também são parte da nossa beleza e têm muito a nos ensinar.
A caminhada pela praça Vicentina Aranha se transformou, para mim, em uma verdadeira lição de vida. Aprendi que em toda floresta sempre haverá um tronco caído, e que isso não é sinal de fraqueza, mas de movimento. Aprendi que nossas próprias quedas fazem parte da nossa caminhada, e que não devemos temê-las. E aprendi, mais uma vez, que não estamos sozinhos, porque com a força de Ogum Rompe Mato e de Ogum Sete Ondas, podemos nos levantar, abrir caminhos e seguir adiante com coragem e fé.
Assim como a floresta segue viva apesar dos troncos caídos, nós também seguimos em frente apesar de nossas quedas. A beleza da vida está nesse movimento, nessa imperfeição que é, na verdade, o que nos torna humanos e nos permite renascer sempre que necessário.
Saravá!
SJC, 08/09/2025
Manoel Lopes
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